quarta-feira, 25 de abril de 2018

NÃO DESPERTE O DEMÔNIO...


O Bar do Seu Pila, na boêmia Cidade Baixa de Porto Alegre era um daqueles lugares que não tinha nenhuma estrela nos sites de avaliações, aliás, era até conhecido como um original muquifo, porém não havia um chope mais gelado do que lá.


E foi neste muquifo do Seu Pila que a historia da Antônia pintou na mesa e atraiu o silencio de todos.

Antônia era uma dessas mulheres que os vizinhos chamam de exemplar. Recatada, trinta anos, casada há onze anos, mãe de duas lindas meninas, mulher de um só homem, pois casara com o primeiro namorado. Vivia para a casa bordando panos de prato e fazendo bolos para agradar o marido, o qual  chegasse a hora que chegasse,  encontraria a Antônia sempre limpinha e arrumada. E, diga-se de passagem, conservada, aliás, conservadíssima, pois o Ademir, como um esposo devotado, respeitava a esposa na cama, isto é, não era de sacanagens como as que a gente faz na rua com as putas.

Quando ela tinha 16, Ademir vislumbrou pela primeira vez aquela singela mocinha nos bancos da sua igreja. Mesmo com aquele vestidinho comprido e aquele jeitinho simplório, o pastor, assim como que por premonição, sentiu que ali na pureza daquele corpinho poderia encontrar as graças do senhor. E realmente encontrou...

O marido, Ademir, 45 anos, era pastor de uma igreja evangélica e seguidor dos ensinamentos da Bíblia. É interessante, pra que se entenda melhor a historia, que o Ademir seguira certa vez, acidentalmente, um dos quesitos bíblicos que se refere aquele que diz “crescei e multiplicai-vos”. O pastor era pai de um rapaz adolescente, coisa que nem a Antônia e nem os fieis desconfiavam. Pior seria se soubessem que o rapaz era fruto de uma aventura com uma mulher de bordel, da época que o bom pastor tinha o hábito de frequentar espeluncas.

Chegou um tempo que a mãe do filho bastardo, apesar de ganhar uma boa mesada pra fazer boca de siri pra sociedade, achou que já era hora de exigir algo mais daquele pai desnaturado. Ora, se o Francisco era literalmente um filho da puta e que não sabia quem era o pai, poderia, pelo menos, gozar da fartura que o pai gozava.

Assim, depois de um complicado diálogo com a antiga amante, o pastor não viu outro caminho se não aquele de alojar o bastardo na sua própria casa. Caso contrário, a vadia botava a boca no trombone. Então o Francisco, já com 17 anos, se integra na família do Ademir. Mas é bom que se diga que não como filho e sim como um sobrinho do interior de uns parentes que estavam passando necessidades. Antônia, inocente e de boa fé, engoliu inteiramente a historia e consentiu com aquilo, pois ficou apiedada com a situação do rapaz. E reconheçamos aí que os pastores são muito bons de conversa.

Só que esta parte do plano tinha sido por enquanto apenas alinhavada. Os acabamentos da obra estavam por vir...

No principio, meio tímido, Francisco foi se ajeitando ao novo lar e, na natureza de um rapaz, foi começando a reparar no insinuante corpo da tia, assim como ele chamava a Antônia. E a tia, mesmo não querendo, foi percebendo o interesse do menino. Francisco sempre andava a vontade em casa, de calção e sem camisa, e Antônia, por menos que quisesse, passou a reparar também no corpo do rapaz. As filhas iam pra escola, o pastor peregrinava pela cidade e Francisco que só estudava no período noturno, fazia companhia pra Antônia. Viam TV, jogavam cartas e falavam sobre a vida.

O pastor não contava com os efeitos colaterais do seu remédio, pois é de domínio popular que aquele cônjuge que trouxer um terceiro para dentro de casa, estará cometendo um grande erro. Ademir deu uma só chance para o azar e o tempo estava prestes a promover uma lambança no sua rotina.

Cabe ainda um intervalo na historia pra dizer o que já dizia, maliciosamente, certo filosofo: “Dorme um demônio no meio das pernas de uma mulher recatada que, se desperto, pode transformá-la na mais devassa das mulheres”.

E quis a vida que este demônio acordasse faminto no dia em que Francisco, nessas alturas já mais íntimo da tia, confidenciou pra ela que jamais tivera experiência na cama com uma mulher. Correu nas entranhas de Antônia uma vertigem tão grande que lhe fez vibrar todo o corpo, como se sentisse ali uma ameaça de orgasmo. Antônia, depois disso, passou a demorar mais no banho e no banheiro, pois só em imaginar que poderia desfrutar da virgindade de um homem, enlouquecia de tesão. A bela mulher do pastor estava subindo pelas paredes...

E numa tarde em que a brisa batia nostálgica nas cortinas, Antônia se refestelava finalmente com Francisco nos algodões da cama proibida. Com uma sede que jamais sentira, ela ensinou ao rapaz até o que não sabia e fez até o que ainda não tinha feito. Exauriram-se de tanto sexo, acabaram-se de tantas sacanagens...

Apaixonaram-se perdidamente e em todas as tardes amaram-se durante meses. Até que um dia o pastor, em veneração ao décimo mandamento que ressalta a cobiça à mulher do próximo, desrespeitou inteiramente o sexto destes mandamentos que aludia a “não matarás”...

E então, numa tarde chuvosa de inverno, Antônia e Francisco jaziam inertes sobre os lençóis no quarto. Restava ao pastor, sentado incrédulo ao pé da cama, com a arma no colo, chorar o sangue derramado.