sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

A GRANDE AUSÊNCIA...

Esta história foi contada pelo Seu Argel, velho frequentador dos botecos da Rua da República, ali na Cidade Baixa, em Porto Alegre. Apreciem.
Por diversas causas que aqui não vem ao caso, viviam os três, o avô, o neto e o cachorro, numa casinha simples de um povoado, ao lado de uma pequena escola. O velho afirmava, com todas as letras, que o vira-lata era de raça. O guri também achava. Os vizinhos faziam troça já que o cachorro, de conhecimento geral, era filhote de uma cadela sarnenta de rua.
À tardinha sentavam os dois, aliás, os três, na frente de casa para assistir ao movimento que não era muito. Ora uma carroça, ora uma bicicleta. Quando um se levantava, por exemplo, para ir ao portão, levantavam os outros dois, fossem quais fossem os dois. Se o velho ia escavar no jardim, juntos iam o cachorro e o guri. Estas coisas serviam para provar o quanto inseparáveis eram. Pra assistir televisão, ficavam empilhados, o cachorro no colo do guri e o guri no colo do avô.
Quando o avô ia ao banco sacar a aposentadoria, na fila, depois dele, estariam sempre o guri e depois o cachorro, apesar dos protestos do funcionário do banco.
Já pensou se um dia um lá não estivesse? Pois aconteceu…
Ficaram sós quando eram dois, e dois não era a conta que eles estavam acostumados. Não conversavam mais, viviam em constante melancolia e saudades. Às vezes vinham no portão, mas não mais sentaram à frente de casa. Caminhavam pela calçada da frente de casa até a esquina milhões de vezes, sem destino.  Meu Deus, quanta falta pode fazer um quando eram três. Como a ausência de um pode esvaziar uma parceria que se diria indesmanchável…
Os dois ficavam enrolando e resmungando em volta de casa, uma hora pra um lado, outra hora pro outro. Até os vizinhos se apiedavam tal a tristeza dos dois. E o relógio sobre a geladeira corria alheio e vagaroso, fazendo desdém da lamúria dos abandonados.
De repente, do lado da casa dos dois, a diretora bate a sineta e dá por encerrado o primeiro dia de aula do ano. A gurizada irrompe para o portão da escola como se fosse uma avalanche infantil.
E correm os dois para o portão e sobram choros e abraços para o guri que chega orgulhoso. Depois de uma longa manhã na escola…

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